A Escola Terra Firme promove momentos de interatividade reflexiva no início e no final da semana e traz vivências de meditação para a sala de aula. A avaliação é de que essas práticas são integradoras, elevam o rendimento nas aulas e promovem a formação de indivíduos autônomos.  

As atividades de “check in/check out” e as vivências de momentos de silêncio têm sido realizadas com sucesso na Escola Terra Firme. Coordenadoras, professoras e professores avaliam que essas ações organizam as turmas e geram a escuta. São momentos de reflexão e de ouvir o outro. O check in é realizado na primeira hora de segunda-feira, para que as crianças contem como foi o fim de semana, o que fizeram e como estão se sentindo. Depois, sexta-feira, no check out é feito o balanço da semana. E há os momentos em que se exercita a capacidade de ficar em silêncio, relaxar e simplesmente ouvir os sons, como acontece na saída e chegada do recreio, ou quando o professor ou professora e a turma sentem esta necessidade.

A experiência começou no semestre de 2018, mas vem sendo preparada há algum tempo e teve destaque na última Semana Pedagógica. Um fator importante foi a visita da fundadora e diretora da Terra Firme, Sandra Cornelsen, à Brockwood Park School, na Inglaterra, fundada pelo filósofo e educador Jiddu Krisnamurti. A instituição oferece educação personalizada e holística com uma pedagogia centrada no incentivo à autonomia e na busca de um relacionamento harmonioso com o mundo, valorizando o silêncio e o compartilhamento de experiências e emoções.

“A mais alta função da educação consiste em produzir um indivíduo integrado, capaz de entrar em relação com a vida, como um todo.”
Jiddu Krisnamurti

Melhor rendimento – Thamy Padilha, coordenadora pedagógica do Ensino Fundamental, avalia positivamente o resultado. Ela entende que as aulas têm rendido melhor e os conflitos diminuíram. No entanto, o início foi difícil. “Os alunos ficavam agitados, falavam ao mesmo tempo. Mas, com o tempo, foram conseguindo, se organizaram, passaram a ouvir e se abriram um pouco mais”, explica. Ela diz que os momentos de silêncio funcionam para respirar e pôr cada coisa no seu lugar antes de começar a aula: “Todos ficam mais concentrados e calmos e isso se reflete pedagogicamente”.

Assim como Thamy, Rosane Marçal, que coordena o Fundamental I, sente que as turmas e professores estão mais sintonizados entre si. Explica que os professores e professoras também falam durante esses momentos e isso os coloca mais próximos da turma. “A roda aproxima sem hierarquias e isso leva a professora para perto da turma, ficam todos iguais”, afirma.

Ganho emocional – Camila Guitti Luppi, coordenadora da Educação infantil, acredita na importância desses momentos. Segundo ela, as crianças precisam ser ouvidas e, pedagogicamente, é uma iniciativa que ajuda muito. “A partir dessas conversas é possível até saber de onde partir a aula, saber se algo não vai interferir”, explica. A coordenadora entende que sempre que a professora sentir necessidade deve pedir para fazer a roda e puxar a conversa, pois nela é possível nomear os sentimentos, o que traz um ganho emocional para todos.

No Jardim III, a professora Solange Jankowski Palmeiro, a Xuxa, ressalta a importância de dar nome aos sentimentos: “As crianças contam como estão se sentindo, sobre as brincadeiras, que foram dormir na casa da avó, que fizeram coleção de algo, ou que ganharam um brinquedo legal. Já sabem nomear sentimentos, como estar feliz, com sono, sentindo cansaço, animação ou tristeza”. Xuxa diz também que promove dois momentos de silêncio diariamente, um antes e outro depois do recreio, quando todos deitam no chão e ficam ouvindo os sons que vêm de fora.

A professora Mariana Batelli, do 1º ano, fala que as crianças falam de si e isso gera muita empatia. “Contam como estão se sentindo e uma cuida da outra. Já tivemos falas de alunos que foram emocionantes, como quando a cachorrinha da Manoela morreu. Outro aluno, o Ian, contou que a tia tinha falecido e também tivemos coisas boas, como quando a Gabriela contou a tia estava grávida e a Sophia que segurou o bebê da irmã”, conta.

A professora Liz Volino, do 2º ano, diz que sentiu diferença, principalmente no check in. “É o tempo da turma para falar. No começo, as crianças contavam coisas que aconteciam, fatos, agora já adicionaram os sentimentos sobre esses fatos”, explica. Para ela, assim se aprende a escutar e a respeitar o colega em momentos difíceis, com solidariedade. Kátia Bassetti, também do 2º ano, aprova a iniciativa. “Organiza a turma e gera a escuta. Eles se percebem e percebem o outro. Já o momento do silêncio é transformador. Fazemos todos os dias e sentimos que cada vez fica melhor, é um processo”, diz.

Especialistas aprovam – Na Semana Pedagógica do meio do ano os temas da meditação e do silêncio, no contexto da Comunicação Não Violenta, foram tratados em palestras e oficinas, com a participação dos especialistas Leandro Citelli, Renata Venceslau e Melissa Brotto, que é professora de Yoga da Terra. Aqui, eles avaliam a experiência da Terra Firme.

Para Leandro Citelli, fundador da “Conexões Vivas” e especialista em psicologia transpessoal, uma das competências do futuro é a Inteligência Emocional, além da Empatia. Ele afirma que os momentos de check in e check out desenvolvem essas habilidades. “Quando se escuta com atenção e se toma consciência das emoções e sentimentos de cada um, se amplia o vocabulário emocional. É um caminho para a autonomia”, diz. Leandro associa o sucesso do check in/check out ao exercício do silêncio: “Para praticar essa consciência das emoções é necessário que existam os momentos de silêncio, especialmente eficazes no inicio das atividades e na volta dos alunos nos intervalos”.

Autoestima e confiança – Renata é advogada, mediadora de conflitos e experiente na implantação e condução de círculos de paz e restaurativos em escolas. Segundo ela, a nova geração está sendo criada para resolver uma diversidade de questões intelectuais, sem levar em conta as emoções. “Atualmente as crianças estão sofrendo pela enxurrada de informações e pelo excesso de atividades e compromissos. Acabam não encontrando espaço para olhar para seus sentimentos e emoções de maneira que consigam identificá-las e amenizar a intensidade”, fala.

Segundo Melissa, pedagoga e bióloga, que tem aperfeiçoamento em Yoga para crianças na Índia e ministra aulas na Terra Firme, a prática do silêncio está sendo uma ótima ferramenta para que as crianças possam olhar para os seus sentimentos e emoções de maneira pacifica: “Auxilia na autoestima, na concentração e no autocontrole. As crianças também desenvolvem maior tolerância, se tornam mais relaxadas, tranquilas e mais autoconfiantes”.

Texto: Luiz Geremias
Fotos: Karina Ernsen e Gilson Camargo